O Equilíbrio Entre o Masculino e o Feminino

Quando ela começou a relatar algumas coisas, eu logo já senti certa semelhança no que eu vivi há uns 8 anos atrás. Eu entendia completamente a angústia dela e, em cada relato, eu me lembrava do quanto eu, um dia, também sofri com isso.  Estava claro o que acontecia: um desequilíbrio entre o masculino e o feminino.

Filhas de mães que ainda viveram sob a sombra do patriarcado e de pais que estão tendo de aprender (alguns nunca aprenderão)  a dividir espaços e responsabilidades, nós, mulheres, especialmente da geração millennials, crescemos em meio a transição de dois mundos. Aprendemos que precisávamos ser fortes, estudar, trabalhar, conquistar autonomia, decidir por nós mesmas e não depender de ninguém, rompendo barreiras em um mundo que ainda aprende a superar o machismo e a enxergar o feminino com respeito. E conseguimos muitas dessas coisas. Tornamo-nos líderes, profissionais competentes, empreendedoras, pilares emocionais da família e administradoras do lar. Criamos nossos próprios espaços com coragem e resiliência. 

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Mas essa força, tão necessária, também cobrou seu preço. Para sobreviver em um sistema que historicamente valorizou a energia masculina — da ação, da produtividade, do controle — muitas mulheres acabaram incorporando esses traços como forma de proteção. Tornamo-nos firmes, práticas e racionais diante da necessidade de liderar, sustentar e decidir. E, nesse movimento, sem perceber, muitas de nós nos desconectamos de nossa natureza mais primitiva, fluida e intuitiva — o pólo feminino da entrega, da receptividade, da vulnerabilidade. Pronto! “Vulnerabilidade”. Chegamos ao cerne da questão. Faz uma pausa aqui e guarda essas informações. 

O Masculino e o Feminino em Busca de Equilíbrio nas Relações

À medida que nosso papo caminhava, entre um gole de café e outro, minha amiga foi falando, falando, falando… na tentativa de compreender e acertar internamente seus medos e inseguranças. Ela precisava, na verdade, entender e aceitar a ambiguidade que estava vivendo. 

O fato é que o marido dela arrumou um bom emprego em uma outra cidade, distante cerca de 3 horas. Em um primeiro momento, até as coisas se acertarem em definitivo, ele estava vivendo em um hotel durante a semana e, aos finais de semanas, voltava para casa, para revê-la. Dá pra se imaginar que a situação não estava das mais confortáveis, certo? Eles estavam diante de mudanças. E mudanças, sabemos bem, nem sempre nos deixam ilesos de desconfortos. 

O problema maior era quando chegava o domingo à tarde, hora que ele tinha de pegar estrada de volta para a cidade do novo trabalho: o filhinho deles dava aquele baile! Pára e pensa bem: estamos falando de uma criança de 6 anos de idade, naturalmente sentindo as mudanças na dinâmica familiar e, principalmente, a ausência do pai. 

Ela, enquanto mãe e esposa, não tinha dúvidas: precisava o quanto antes se mudar para junto do marido, restabelecendo o fluxo e harmonia familiar. Mas enquanto profissional, conquistadora e dona de seu próprio nariz praticamente uma vida toda… Como fazer?
A ideia de deixar seu emprego a aterrorizava de tal forma, que eu bem a entendia. Ela levaria um tempo para se restabelecer na nova cidade, criar vínculos, encontrar um novo trabalho e galgar novas posições na carreira. Enquanto isso… às custas do marido! 

Não que o marido a pressionasse quanto a isso. Muito pelo contrário! Ele é bem parceiro dela, a ponto de passar tranquilidade e segurança. Massss, amigo… nós somos millennials, lembra? Nós não estamos acostumadas a contar com apoio financeiro de ninguém! Nós fomos acostumadas a bancar, lembra? Tudo, tudo, tudo!

Prezando pelo bem-estar da família e abraçando as novas perspectivas que a vida vinha apresentando, ela não teve outra escolha a não ser optar pela demissão de seu emprego e mudança para a nova e atual cidade onde o marido estava trabalhando. 

Ela realmente sentiu muito. E eu sei bem o quanto. Em um determinado momento do meu namoro (com meu atual marido), eu passei por algumas dificuldades financeiras e a primeira vez que ele pagou minha conta, eu quase morri de chorar dentro do banheiro do bar que estávamos. Tudo o que eu disse a ele para justificar meus olhos vermelhos e inchados era completamente em vão, pois parecia além da capacidade humana dele em entender como eu poderia estar tão chateada com algo que ele estava fazendo com gosto. 

Eu posso dizer que esse desconforto vai além da questão material. É como se, ao depender, perdessemos algo da nossa identidade. O que dói não é precisar de ajuda, mas acreditar que isso nos torna menos capazes, fracas e fracassadas. Essa sensação nasce de uma geração inteira que aprendeu que amar só é seguro quando não há necessidade.

No entanto, a necessidade não é fraqueza — é parte da natureza humana. Desde os primórdios, homens e mulheres partilharam funções complementares. O homem, em essência, representa a direção, o instinto de proteger e prover. A mulher, a acolhida, o laço que mantém a vida pulsando. O homem é o sol, o fogo, o dia, o céu, o externo, o yang, a ação. A mulher é a luz, a água, a noite, a terra, o interno, o yin, a intuição. A verdade é que esses arquétipos — o masculino que sustenta e o feminino que nutre — permanecem vivos dentro de nós. Eles não são prisões, mas linguagens da alma, moldadas pela história e pelo tempo.  

O problema surge quando essas energias entre o masculino e o feminino se confundem a tal ponto que causam um desequilíbrio muito forte. É normal que a mulher tenha um pouco do masculino, assim como o homem tenha um pouco do feminino também. Mas viver permanentemente fora do seu polo é onde o xabu acontece. A mulher que vive permanentemente no polo masculino — resolvendo, planejando, controlando —, perde espaço interno para simplesmente ser. E quando o homem, diante disso, perde o papel de presença, de direção e propósito, a relação se desequilibra. A polaridade que cria atração e harmonia se dissolve, e o relacionamento se torna um campo de disputa silenciosa.

Nas relações modernas, esse desequilíbrio entre o masculino e o feminino se expressa de muitas formas. Mulheres ainda enfrentam a sobrecarga feminina dentro de casa; homens sentem-se desorientados, temendo ser vistos como machistas ao exercer seu papel de provedor. Mulheres sentem culpa por desejar segurança, homens sentem medo de oferecer direção. O resultado é uma geração de relacionamentos intensos, mas confusos — onde ambos querem amar, mas poucos sabem como equilibrar o dar e o receber.

O caminho de equilíbrio não está em voltar a um passado patriarcal, nem em eliminar as polaridades de gêneros, mas em curar o excesso e integrá-las harmoniosamente, reconhecendo o valor das diferenças.

Em meio a minha crise, igualzinha a que minha amiga passava, eu entendi que: está tudo bem a mulher ser cuidada financeiramente ou emocionalmente pelo parceiro, especialmente em momentos de vulnerabilidade. O meu feminino precisava lembrar que isso não diminui a minha força ou independência — apenas revela outra forma de poder que eu tenho. Está tudo bem meu marido assumir seu papel de sustentação e proteção, desde que isso nasça do amor e não da imposição. O masculino dele precisa compreender que prover não é dominar, mas servir com presença e propósito. Quando resolvi honrar essa essência de cada um, a minha relação interna deixou de ser uma guerra e voltou a ser abrigo.

Nesse episódio da minha vida, eu, que aprendi a ser forte, fui convidada também a ser inteira a partir das partes. A curar o excesso de dureza com a ternura. A lembrar que posso confiar, pedir ajuda e repousar. A devolver ao meu marido um espaço que ocupei em exagero, privando-o, muitas vezes, de exercer sua presença e propósito na relação. 

Talvez esse seja o novo capítulo das relações: um tempo em que não se trata mais de competir por poder, mas de caminhar lado a lado. Um tempo em que o feminino e o masculino, cansados de lutar, voltam a dançar — e nessa dança, o amor reencontra o seu ritmo.

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